domingo, 30 de março de 2008

E você me toma os pensamentos mais uma vez e me corrói e me possui com um vigor que nunca ninguém pôde imaginar, surpreendendo até a mim, que achava ter passado por algo semelhante e inclusive ter superado sua insensatez. Mas, não. Você ainda grita dentro de mim a beleza dos seus poucos anos, seus pensamentos mais doces em contraste com todas suas palavras de ordem. Quando falava a você sobre a paz e contra a agressividade, queria dizer da minha vontade reprimida: agredir a mim, por me deixar possuir e pensar que isso só passa comigo e por ter vontade de gritar, assim como você faz na minha cabeça o dia todo, que eu não concordo! Essa minha permissividade é mentira. Detesto pensar em dividir você, pensar em não estragar e pensar em perder sem ter feito algo de errado. Aliás, fazendo, por duas vezes as coisas convencionalmente certas. Pura mentira, também. Sempre fiz tudo errado, mesmo que por pensamento. Mentalizei muitas flores, sim. Mentalizei ainda mais estrume. Não acredito em vocês, pessoas. Acredito que a qualquer hora, vocês, pessoas, e você que não fez nada além de me atormentar por meses e meses e meses a fio irão me decepcionar. Então, visto-me de delicada. Teria você, dono de toda uma fala sabiamente coesa, coragem de me perceber como o que há dentro? Não. Não teria por ser fraco e por estar ainda nos meus pensamentos, o que me faz querer parecer com você, minha grande mentira para a maldita “afinidade”. Comprei a afinidade, li as coisas certas, escutei suas músicas, partilhei o meu corpo, como você tanto disse. Menti para mim, para você e para os outros. Hoje percebi a gravidade de me permitir, estragando não a mim, mas aos outros com nossas promessas que não serão cumpridas. Os outros, rapaz! Os outros, tão bem mais resolvidos, como você disse e como acreditei - nossa mentira. Digo, então, que me fecho. Andarei, por ora, com as mãos amarradas para trás, não vou tocar em mais nada. “É porque é. É porque é. Não há desespero em vão”. Não... Eu terei asas!

quarta-feira, 19 de março de 2008

das datas. de um parto vazio. de gente vazia.

"Deus, proteja o filho teu.
Não deixa o mal ganhar.
Por onde se escondeu
enquanto o céu caiu?
e a chave não abriu
e a estrada se acabou
e a ponte não passou
pra lá desse lugar."




Deus! Se te questiono é porque te quero bem. Diga-me, por onde você vais, agora? Escondendo por trás de armaduras, expondo-se pelas rugas e pelos cabelos grossos e brancos. Cabeça tomada por uma brancura... de idéias, ao menos idéias divergentes às minhas. Se sentes vontade de fuga, foges sem me deixar questionar. Criou-me (ou criei-me?)... no meio dessa brincadeira, ensinou a mim que esse cuidado era uma premissa, sem saber de em suas ‘aventurâncias’ futuras, este conceito não caberia. Não cabe também eu acreditar nessas ‘aventurânicas’, cada vez mais expostas pela armadura de rugas – mais uma divergência. Questiono: foges de quê? Estás sob seus olhos o que há de errado, se existir realmente algo de errado do lado de fora, e a decisão é sua, não posso questionar isto. Dizes tanto e de forma tão rasa que quando nunca me questiona é porque me quer bem, mas são palavras... rasas. Deixa-me livre, eufemismo para dizer que me quer desprendida de você. Não sabes, mas hora sim, hora também, necessito de interrogações ou de uma armadura verdadeira de rugas; que possa permitir que eu crie rotas de fugas alternativas do que eu, certamente, diria não ser meu lugar. Lugar que cada dia mais descaracteriza um lar, porque há fuga minha e sua. Eu te quero como não és. Queres de mim algo que não posso ser, por querer-te como referencial. Vejo-me em ti e nossos rostos fecham devagar, nossas bocas emudecem sem perceber. Perdemo-nos... E não adiantará o amanhã e o “esforço para lembrar (a vontade de esquecer)”. Sabe? Não me compras. Não necessito de escambos, sou livre dessas coisas, vale-me o que há por trás, que você sempre justifica – como se pudesse justificar a falta que me fazes, dizendo que somos de uma matéria só – mentira sua para mim, que eu finjo acreditar – mentira minha para você. Vais, porque necessita fugir de você. Mas, sua volta está velada, voltará aos mesmos ais, que são também meu ais, mesmo que sejamos de matérias diferentes... Como podemos ser tão estranha uma a outra se sou seu desdobramento? Acho... não, estou certa que seu ventre ao me parir estava oco.

domingo, 9 de março de 2008




Eles estavam um no outro, naquela madrugada quente. A rua deserta fazia fachada para tolices, enquanto caminharam de mãos dadas até a esquina. Foi ali, exatamente naquela hora, que, displicentemente, as mãos se soltaram. Ele não tentou pegá-las, ela fingiu que não sentiu. Os olhos se viram. Os braços oferecem achego, mas as mãos não se tocaram... Ele se virou, ela permaneceu parada. Ele deu o primeiro passo, ela petrificou-se. Ele fazia-se costas, ela abaixou os olhos, levando-os ao chão. Ali, bem ali, na madrugada quente, criou-se duas novas vidas separadas por um buraco gelado, aberto aos pés e dentre(o) (d)eles.

E teria a brisa quente levado a figura desse bonito a perder no horizonte, se não fosse a necessidade de deixar tudo sereno, traduzindo o encolher dos ombros e, já, lá longe, no virar da cabeça, o último olhar de palavras rompendo o silêncio compreendido.
Aquela noite era apenas mais uma noite quente, sem chover....







quarta-feira, 5 de março de 2008

Palavras retirantes...




ou... Algo do tipo:

“Entretanto sou incapaz de dizer o que é que eu quero, apesar de ansiar pelo que espero de alguma forma secreta. Pois muitas vezes, e com freqüência cada vez maior, a medida que o tempo passa, dou comigo de repente a interromper minhas andanças, como se eu fosse paralisada por um olhar estranho e novo sobre a superfície da terra que conheço tão bem. Um olhar que insinua alguma coisa; mas que se vai antes de eu perceber seu sentido. É como se um riso nunca visto furtivamente se estendesse num rosto bem conhecido; por um lado dá medo, no entanto, por outro, ele nos faz um sinal”.


(Contos Completos – O diário de Mistress Joan Martyn – Virginia Woolf).