domingo, 18 de maio de 2008

"Esquadros"

”isso de querer
ser exatamente aquilo
que a gente é
ainda vai
nos levar além”

(Paulo Leminski)





Passei 922 dormindo, submersa em um sonho. Mal sabia eu que sonhos não se dão, sonhos são embriagáveis. Dormi por esse tempo todo em algo que eu criei em areia, como uma vida, bastando a si mesma, fora do (meu abominável) normal. Se em meio ao sonho viessem planos, os sentia em cada detalhe enquanto me tocavam e por vezes me tocaram. Dizia a antiga-menina-eu para a nova-senhora-eu que era assim porque era; o sentir supera boa parte da podridão. E foram 922 dias entre acordar, sonhar, intercalados por uma espera sem fim, onde a palavra ganhava ares de metáforas, o corpo ganhava apenas mais um toque relapso e o que fica atrás do meu pensamento conformava-se em uma não paridade: “solitude”.

O que se passava nas magias sensoriais eram ilusão de uma complexidade surreal, enquanto em meio ao que se é, de um outro lado da cidade, ao alcance dos meus olhos, os detalhes simples corriam, sem que eu os percebesse. Ontem, for fim, o fiz: estômago embrulhado e uma epifania. O mundo de súbito se apresentou para mim novamente enquanto meu eu orgânico implorava-me atenção. Doía-me o estômago, doía-me o sentir que nunca pôde existir e naquele momento ainda doía-me a verdade. Consolo-me, eu por mim mesma, ao saber que o dormir passou, deixando esse rastro de vida despertando... Volta a mim, suavemente, minha alma como pássaro em vôo entre cerrados, desertos e ares, novas ares das "infinitudes" e simplicidades de ser exatamente aquilo que se é.


domingo, 11 de maio de 2008

Feito sopro


Por vezes, então, anéis quebrados e maravilhosas antiguidades perdidas e nada mais a ser feito, ei-lo: o inesperado. Tocando-a pela face o perigo das noites grávidas de elegantes sorrisos regados pelo arrepio correndo o corpo a gritar a vontade de corresponder àquela boa nova. Faces, instrumentos e sentires que podia, libertar é ser simples, mas a tornava imensa ao talhar detalhes inesperados desse mistério e doçura. Agora, sim, mais uma vez, como tudo que voa por ai, a única coisa que a espera é exatamente o inesperado. Ela corre perigo, um doce beijo de flor. O inesperado de cada pétala e o momento esperado da doçura em tocá-lo. O perigo... o perigo e a simplicidade dos momentos inesperados...
Nada mais se tem a fazer quando não se recebe doação em resposta a sua entrega. Não, sabe-se, exatamente, quando o afirmativo apresenta-se, em entrelinhas, como uma negação. Uma não entrega consumada ou feita pelas metades nas doçuras dos dias, dos fluídos, dos corpos. Nada mais se tem a fazer quando pela última vez ela apertou contra o peito aquela coisinha, tendo-o como intocável, vendo sair aquelas palavras que no mais diziam o que ela não queria ouvir. Eles haviam protelado o fim, consumado, agora, na doçura de um momento cavado. Ela come a luz.
Ela come a luz e nasce de dentro dela a liberdade... Não há nada mais a se fazer.

domingo, 4 de maio de 2008

Irracional...

Talvez ...

"Talvez não ser,
é ser sem que tu sejas,
sem que vás cortando
o meio dia com uma flor azul,
sem que caminhes mais tarde
pela névoa e pelos tijolos,
sem essa luz que levas na mão
que, talvez, outros não verão dourada,
que talvez ninguém soube que crescia
como a origem vermelha da rosa,
sem que sejas, enfim,
sem que viesses brusca, incitante
conhecer a minha vida,
rajada de roseira,
trigo do vento.
E desde então, sou porque tu és
E desde então és
sou e somos...
E por amor
Serei...
Serás...
Seremos..."
(P. Neruda)

sexta-feira, 2 de maio de 2008

Fundir. O tácito ao vivo. Romper paradigmas das subjetividades. Fundir-me em algo que possa ficar na terra. Cortar o gás. Inebriar ou matar-nos com estes... Fundir-nos, nas banalidade diárias. Ela e eu. Eu e eles... O beijo e a boca, corpos e espírito, delicadeza e rudezas. Não plenitude dos verbos com a intransigência dos mesmos. Fundir-nos; o que acreditamos com o que somos. Ou o que não somos ou, ao menos, o que não podemos nunca ser.

Ficando para o sempre-agora, no ar...


Fundir-nos, senhor. Deus-homem, figura imaculada. Leve de mim toda a castidade... Absorva-me em despudores, funda-me neles, nos outros e em outros tantos. Não deixes nunca o caminho vão. No ar, meus senhores, deixe-me, pois, é de minha única responsabilidade. Não me funda, Senhor, no que não acredito. Funda-me, intransigentemente em oração, ao não humano. Funda-me na boca, o toque e, nos dedos, os ares...