quarta-feira, 31 de outubro de 2007

Do imutável

Que amava Rita que amava Dito que amava Rita que amava Dito que amava Rita que amava. E amava...
Que amava Rita que amava Dito que amava Rita que amava Dito que amava Rita que amava.
Que amava Rita que amava Dito que amava Rita que amava Dito que amava Rita que amava.
Que amava Rita que amava Dito que amava Rita que amava Dito que amava Rita que amava.
Que amava Rita que amava Dito que amava Rita que amava Dito que amava Rita que amava.
Que amava Rita que amava Dito que amava Rita que amava Dito que amava Rita que amava.
Que amava Rita que amava Dito que amava Rita que amava Dito que amava Rita que amava.
Que amava Rita que amava Dito que amava Rita que amava Dito que amava Rita que amava.
Que amava Rita que amava Dito que amava Rita que amava Dito que amava Rita que amava.


E, dito que amava Rita que amava o dito que amava Rita que amava. E amava... E amava toda a quadrilha também.

quinta-feira, 18 de outubro de 2007

E a menina olhou para o casulo. Analisou os riscos de abri-lo agora... Pegou um graveto, cutucou de todos os lados expondo a lagarta metade transformada. Via o de dentro: aquilo meio bicho, meio borboleta. Tocou-o com as mãos. Ele se moveu, estava vivo. Pareceu florescer ao redor e aquilo, por um instante, pareceu poder voar. Mas algo ali parecia nada. Sete vezes, nada. E a menina olhou para aquilo nas suas mãos, um monte de desastrosos nadas. Olhou-o mais intensamente. Percebeu sua beleza e, de tão belo, temeu que outros o levasse para bem longe dela. Então, segurando-o entre os dedos tortos, levou-o até a boca e o engoliu. Agora, os nadas de dentro e de fora se juntaram e a SUA (só sua...) beleza estava salva.

quarta-feira, 10 de outubro de 2007

Ao Senhor U., remanescente e saudoso soldado,


Venho primeiramente saudar-lhe pela audácia de escrever-me. Poucos sabem do que não sou. Outros menos sabem do que me tornei. Você encerra tais delimitações. Pretendia esmiuçar a situação, visto que desses lados do muro vê-se coisas diferentes do que as minhas. Resolvo, de súbito, que não. Deixarei-lhe com lamúrias de uma senhora. Quarenta e três anos - vulgos três, passados dentre armar-me e negar-me. Lamento, não somente por pactos quebrados, fixei-me no conhecer para alcançar além das camadas aéreas. Lancei-me ao espaço, não diferente de como faço hoje metaforicamente. Lancei-me. A causa era nobre, fortificar-nos; ó, Senhor , por vezes esqueci de fortalecer-me por mim. Fortalecia-me a luta, progresso da comunicação. Pressentia e comprovava o improvável perfeito, que seria provável com tal corrida contra - quem sabe? - o tempo. Tempo, tempo, tempo, tempo, tentei sim, coexistir pacificamente. Mas, ideologicamente segui a lutar e as crises inevitáveis também a coexistir. Confesso-lhe que pensei amenizar-me, vã ilusão. Voltei-me esquiva, dentre aspas, novamente ao provável – desta vez, suprimido o prefixo. E, não menos provável: armas aos inimigos. Articula-se obscuramente a troco de cessar-me. Destas, impulsionaram reformas cheirando a mofo e que de certo nasciam de labirintos com grandes prateleiras. Sim, meu saudoso soldado, não podias ver-me, assim como a mim mesmo tal era negado. Sob domínios dúbios tentei aproximar-me de mim diplomaticamente, princípio de meu fim. Perto do fim, puderam, então, escolher pela primeira vez. Meio do fim, puderam presenciar quedas do que faziam você ver coisas diferentes das minhas. Caíram peça por peça. Uma a uma, de cores, decoradas, arrancadas. Uma a uma. Não nego-lhe, abriu-se espaço para verem o caos. E o caos antes instalado seria arrancado -um a um, independente do tempo. E lhe afirmo, mesmo que em processo, hoje isto será improvável. Extremamente improvável que se desfaça de tudo. Sigo, desde então, com uma lucidez perigosa, como as de quem antevê renuncias próprias em detrinimento ao desconhecido. Novamente, arrancam-me de mim, do mundo, do caos. E mastigam-me politicamente, paradoxalmente independências – neste caso, deixaria em questionamento a propriedade do prefixo, use-o como bem entender. “(Pré-)fixos”. Use-os um a um, arrancado-os - ou não... - sem expor-me e, surpreendentemente, sem que haja necessidade real de questionar alguma validade ou veracidade de tal relato que lhe escrevo aqui, pois o que lhe escrevo veio apenas de mim. De toda docilidade noturna e sua não luminosidade; e estando presa deste asilo, não sinto-me louca apenas ao sol. Fique comigo através do que fui um dia, saudoso soldado remanescente. Hoje, passados 31 dias do presente mês e lamentavelmente véspera de completude do mês destes 43 anos passados, renuncio-me. Renuncio-lhe, sonho, trancafiando-me ao sol. Enfim, meu amigo, desejo não incomodar-lhe; e caso receai e recusai esta confissão, pediria-lhe que meditasse primeiro, pois esta é a única que posso deixar-lhe.

Pois bem: Sou-me, inglório fim.

Beatriz.

Kiev, 31 de dezembro de 1991.

quarta-feira, 3 de outubro de 2007

Morte-vida

Um ano. A data veio e ela a matou. Matou o beijo escondido, final e começo de namoro em seqüência, dias de matar aula, bilhetes de cinema do Diammond guardados na carteira, bilhetes-poemas no caderno. Ela matou os instrumentos que empoeiravam na sala e no quarto. Poeira vinda da falsa liberdade da porta sempre escancarada do paraíso deles. Música que unia opostos. Medo de mãe, dos outros. Muitas farras, farpas. Leveza e rudeza que se completavam naturalmente. Vontade tanta, unir-se. Festa para anunciar a loucura em um ano. Um ano. Um ano depois do depois, matava-os em remédios, crises. Em carros, velocidade. Em pontes, destruição. Ameaças telefônicas. Rosto desfigurado matava levezas já perdidas. Ela chorava caída no chão. Ele de pé com a mão, ainda trêmula, estendida. Já havia matado o respeito. Consultas, decisões sem consulta. Matou-se por um, mais um, mais um anos de sua mocidade. Arrastou-se. Esqueceu de equilibrar entre pólos. Dois. Um de pé. Outro caído. Alegria de arrancar anel do dedo e jogar com força no chão. Anéis, taças, pontes, corpos, chão. “Eu me atiro em você, vida!”. “Eu te tiro de mim, morte!”. Tristeza de depois. Depois de dois pólos, três tempos: um ano. A data veio e ela esqueceu. Agora, ela bebe. Ouve canteiros. Levanta a taça, comemora e se torna assassina.

- Eu te mato, saudade!

segunda-feira, 1 de outubro de 2007

“É difícil perder-se. É tão difícil que provavelmente arrumarei depressa um modo de me achar,
mesmo que achar-me seja de novo a mentira de que vivo."
(Clarice Lispector)
Nós somos mim.
E para ser mim, não basta eu. Eu-eu relação ativa só para os outros, quando não mim, não eu. E este eu sem mim é passivo, fecha e abre cortinas como se abrisse janelas para os diversos eu. Mas para ser eu, ativo, preciso do sopro de mim. Nós somos mim. E mim quer, mim necessita ser eu ativo, com liberdade de inventar as conjugações porque mim como nós nunca terá regra, nunca será expresso, por mais que mim faça do sufoco, palavras. Só mim faz isto. E ser-me não há regra; não é expresso por não existir, apenas suportar o eu passivamente. Nós somos mim. Nós-mim dá-me o eu falado, nós-mim é o sopro de uma única existência sem regra, que se preenche de nadas para ser só tudo. Nós-mim, sopro de existência, enche-me e esvazia-me de eu. Preciso perder-te de mim para encontrar-me eu, mas nós somos mim. Nós somos mim, mesmo sem nunca ter-te mim...
Eu não sou-me sem mim.