domingo, 25 de novembro de 2007

Colocava-o na água do café, dobrava com ele a muda de lençol. Pegava a vassoura e apertava contra o chão... Queria varrer toda a sujeita para ver dançar a poeira, pedaços pequenos dele. Partia para molhar o jardim. Molhava cada folha, cada flor. Quando olhava para o céu via espectros luminosos que estavam ali para aquecê-la, vencendo toda a imensidão que se fechava pela folhas da copa da mangueira. Ela o sentia. Ele a tocava... Entrava para a casa, refazia-o em cada pitada de sal, no gás aberto e no fogo acesso. Alimento pronto, ela se aprontava. Passava no espelho batom, vermelho, a cor dele. Fazia o contorno dos lábios em forma de coração e saia. Durante o longo dia, dentre livros e aulas, ela se regava, se aquecia, se maquiava na certeza que voltaria acompanhada por ele. Chegada a hora do regresso a ela. Ela voltava para casa... Abria a porta com a chave dele, a chave certa. Caminhava a passos lentos até o quarto onde ele estaria com a muda de lençol. Nada. Corria até a cozinha para encontrá-lo na água do café. Nada. No jardin; folhas secas. Da cerca de mil flores, sumiu uma. Da copa os espectros já não passavam. Ela agarrava com força a vassoura, pés na terra. Varria! Varria! Varria! Não subia poeira... nada dançava. Ela varria então seus pés. Esfregava-os com força na terra, na vassoura, no mundo. Ela se varria... mas não levantava. Na busca por algo, se viu numa mesa. Em baixo, encolhida, abraçava as pernas, balançava o corpo para frente e para atrás e repetia, repeita, repetia para seu mundo:
- Amor de plástico. Amor de plástico. Amor de plástico. Ele só está atrasado... O amor só está atrasado... Ele só está atrasado... Ele só está atrasado... Amor de plástico atrasado.
"A lua deita seus

Raios sobre a rosa caída.
Beleza morta."

quarta-feira, 21 de novembro de 2007

Que de sorte eu não tenha nada. Que dessa moeda me saia a resposta. Cara, sim. Coroa, não. Quanto de realidade o homem suporta? Coroa! Falta-me coragem. Quanto de fantasia é necessário para suportar a realidade? Cara! Onde foi mesmo que deixei meu rosto? Uma moedinha, dez centavos de Real. No ar, para cima... Para baixo...

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Fechada na palma da minha mão...

sexta-feira, 16 de novembro de 2007

"Para que te serve essa cruel boca de fome?
Para te morder e para soprar a fim
de que eu não te doa demais, meu amor,
já que tenho que te doer,
eu sou o lobo inevitável pois a vida me foi dada. (...)"


Venho comemorando meses de minha morte. Dia após dia, a mesma comemoração: um caminho escolhido, percorrido e findo sempre na mesma cerca. Nela, deixo pedaços de mim em comemoração. Aproveito os mínimos espaços dentre as farpas - a valsa da comemoração, enquanto sinto, uma a uma, rasgar o vestido que me deram; cortar os milímetros de pele nova que também me deram; ver o branco das flores no cabelo mudarem para vermelho. Esta é a melhor hora, quando espremia-me para caber na tortuosa recompensa do caminho. Por vezes, quis padecer ali. Por vezes, quis apressar-me e sair nua de roupa, de pele, de flores, de mim. E, em outras tantas, quis apenas ficar estática, sentindo cada farpa; ficar ali com a pele rasgada, o vestido molhado e com as flores dependuradas... Venho comemorando meses de meu (re)começo. Dia após dia, a mesma comemoração: sangrar para saber que eu estou viva.

segunda-feira, 12 de novembro de 2007

Da volta.

Eu apenas queria que você soubesse
Que aquela alegria ainda está comigo
E que a minha ternura não ficou na estrada
Não ficou no tempo presa na poeira

Eu apenas queria que você soubesse
Que esta menina hoje é uma mulher
E que esta mulher é uma menina
Que colheu seu fruto flor do seu carinho

Eu apenas queria dizer a todo mundo que me gosta
Que hoje eu me gosto muito mais
Porque me entendo muito mais também
E que a atitude de recomeçar é todo dia toda hora
É se respeitar na sua força e fé
E se olhar bem fundo até o dedão do pé

Eu apenas queria que você soubesse
Que essa criança brinca nesta roda
E não teme o corte de novas feridas
Pois tem a saúde que aprendeu com a vida...
(Gonzaguinha)


Ciclos. Morte-vida. Na volta do barco, o cansaço pesa muito mais...