domingo, 21 de dezembro de 2008

antes um mês eu já nem sei


E, então, amanhecemos. Suave, tão suave quanto um suspiro. Levíssimo o caminhar se faz, como se a vida se dividisse em com e sem companhia. E, por certo que a vida se dividiu. Marcadores de água e rios que, aos poucos, vislumbram braços de mar. Enfim, começamos um novo florir, sem a urgência das flores das estações, sem a teimosia das flores eternas e sem vendavais. Calmo, leve, surpreendente em expansão a cada novo verso silencioso das mãos de cuidado que nos cercam e nos protegem do resto do mundo. Minha amnésia alcoólica, meu torpor asfixiante e meus ‘eus’ não fazem mais sentido; meu mundo, agora, possui uma tranqüilidade bucólica do ainda que está por vir.

quarta-feira, 26 de novembro de 2008

Quis com meu dia clarear o seu. Quis imprevisto. Quis quintas-feiras. Quis expressões de surpresa e ser colocada a sua frente, mais uma vez. Tudo o que quis - quisto silenciosamente. Certeza do momento por tanto querer. Quis não me movimentar; esperar o seu dia clarear o meu. Quis meio-dia. Quis meia-noite. Quis, além de tudo, que a gente se encontrasse... sem relutar. Por (te) querer tanto, tudo será gozo e riso - silêncio, se a gente, em paralelos, quiser se encontrar.

terça-feira, 21 de outubro de 2008

O vazio dói quase como a dor da perda. Apesar de não ter perdido, organicamente, nada. Falta-me braços, como falta-me recheio. Falta tanta falta... que dói. E dói... sem a esperança de que a terapia por esses amontoadinhos de letras pudesse curar-me de mim. Eu, dói. Eu, vazio dói. Essa falta do que nunca houve faz doer. E dói. Transpira por todos os poros esses mins mutáveis e dói. Dói. Não é possível que ninguém nunca tenha doído como eu me dôo. Quisera não ser assim. Quisera abrir os braços, que me faltam, e rasgar-me inteira... quisera não expor o vazio. Quisera não doer essa dor lenta... Quisera apenas sumir e doer ainda. Doer calada apenas. Apenas dói. Sem mais... Esse luto que não passa. Sem entender os porquês, aumenta o doer a cada dia. Aumenta-me. E dói. Eu, abstrato, dói. Se ao menos sangrasse... mas não; o silêncio dói, apenas.

sábado, 18 de outubro de 2008




Agora sei de mim: sou só. Tenho para mim mesma uma liberdade que não sei usar porque ser liberta exige uma grande responsabilidade que se perde também em mim. Eu assumo a solidão e minha inabilidade com minha própria liberdade. Existe em mim nomes próprios em consonância a hologramas que eu mesma crio. Acabo de entender que eles também são libertos e não sabem ser responsáveis por isso. Assim, eles seguem, apressados, seus caminhos elípticos. Depois, voltam como se o movimento circular ao meu encontro não fosse também o movimento para os demais caminhos ao encontro deles mesmos... como creio que seja. Devagar e só, ainda tenho um olhar esperançoso para o amanhã. Guardo o seu nome - meu segredo, sabendo que preciso de silêncios para continuar...

[Realize - Colbie Caillat]

segunda-feira, 13 de outubro de 2008

Chasing pavements

"Com pedras construí um gargalo
no horizonte do meu tempo...


...

2006
“... E o fim de nossa viagem será
chegar ao lugar de onde partimos.
E conhecê-lo então pela primeira vez.”

(T. S. Eliot)

2007
“Eis o momento! Começando
nesta porta, um longo e eterno
caminho mergulha no passado:
atrás de nós está uma eternidade!
Não será verdade que todos
os que podem andar têm de já
ter percorrido este caminho?”

(F. Nietzsche)

2008 / 1º
“O que foi, é o que há de ser; e o
Que se fez, isso se tornará a
Fazer: nada há, pois, novo debaixo do sol”

(Eclesiastes 1.9)

2008 / 2º
“A melodia que não havia
se agora a lembro
faz-me chorar.”

(R. Alves)

...

... Torno a me encalhar
para presentear de ausência
um porto sem embarcações,
a quem partir."

sábado, 4 de outubro de 2008

segunda-feira, 15 de setembro de 2008

Fogo e gasolina

"Quanta merda, hein? Se pudesse escolher, dormiria até tudo passar, e tudo vai passar. Antes que... Ai, antes que nada. Só estou falando um monte de besteiras, pois falo sobre o que eu não sei dizer. Como os apaixonados fazem. Os apaixonados desprezados, claro. Os que sofrem por amor e acham que devem sempre falar sobre isso. Sobre suas más condições. De estarem prestes a morrer sabendo que não vão morrer."

[Fernanda Young - Do Efeito Urano]



Que mal faz, na hora em que eu cantava "eu gosto é do estrago”, ter passado um anjo e dito “amém”, se, a mim, sempre é mais interessante o terceiro lado?

sábado, 6 de setembro de 2008

Existe entre todas as coisas uma essência velada, talvez um sentido secreto que não pulsa aos olhos nus. Para senti-la ou vê-lo, acredito eu, é preciso das sutilezas de sorrisos escondidos. Esta essência não surgirá em duas ou três verdades displicentemente ditas meio a um pool de meias palavras. O que pinta meus sorrisos tímidos é isso, aos meus olhos: Ver um certo modo de temer, um certo modo de tocar, um destino disfarçado em dor e prazer, como os meus. Nós nos reconhecemos. Cabemos nós em nossos mundos, mas poderíamos envolver, em par, a fumaça residual dos nossos tragos?
...
Não mais preciso caber em braços, agora que vejo outros do mesmo tamanho que os meus e a isso eu chamo de Amor.

domingo, 17 de agosto de 2008

Da estação confusa. Do enfim...


... Tudo começou devido a um pequeno milagre, mais precisamente, pela necessidade de descrevê-lo sobre a figura de sempre-vivas. Cantei a beleza e a eternidade de cada pequena pétala branca, sem saber que, em cada uma delas, eu iria encontrar além da beleza verde da natureza, a eternidade roxa traduzida em uma presença silenciosa. Sem saber exatamente sobre o que cantava, tornei-o abstrato, para que de minha voz ecoasse poesia. Não ecoou... A dor calava-me e minha atenção voltava-se para as sombras daquele encontro-pequeno-milagre que aconteceu entre eu e as minhas pequeninas flores brancas. Estas que furtam-nos o olhar, preenche-nos de uma presença ausente... Flores que teimam em ficar, dentro no nosso beijar de pálpebras, talvez esperando os olhos se abrirem e, deles a chance de um outro olhar, assim, como este meu, quando, distraída e outonal, apenas terminava meus dias tempestivos. Elas ainda permanecem no meu olhar confuso, assim como a tímida certeza de mais sorrisos e a busca da essência. Neste momento menor, onde os ventos castigam todo e qualquer jardim, busco adentrar-lhes sem invadir, pois há algo em mim e nas minhas flores milagrosas, algo que enternece ao ver o movimento de renovação. Não pretendo cultiva-las, não pretendo exibi-las como quem se gaba por uma conquista. Há entre nós algo de igual, uma alegria-triste, uma beleza efêmera ou a junção do verde e do roxo. Não pretendo também pensá-las visto que carrego em mim uma felicidade inexplicável só por ter olhos que as vêem, ali, desenhadas e extremamente diferentes, apesar de serem as mesmas. Neste segundo olhar de dentro, eis meu milagre teimando em ficar... sempre vivo.

domingo, 10 de agosto de 2008

quinta-feira, 7 de agosto de 2008

‘Água marina’.

Molho-me em luto, agora, quando o visceral não se manifesta.

Chora o que há demais nos outros sentidos, compulsivamente, a perda não específica: Pequenas coisas.

Olhares e anzóis que emergiam a vivacidade das minhas profundezas.

A imensidão se perde dos meus olhos. A imensidão se perde aos olhos, só...

Solidão tomada pelo cansaço dos movimentos intermitentes das ondas aos meus pés.

Perderam-se os olhos na imensidão e, novamente, lançada à sorte,

eis a incompreensão; eis a morte. Mato-me (amor). Mas, tome-o!




‘Coração lançado ao mar’.



quarta-feira, 30 de julho de 2008

"(...) como um segredo que cai do sonho.

Depois, abri as mãos, — e perdeu-se.




Agora, creio que vou morrer."

segunda-feira, 28 de julho de 2008

Oi, eu sou esquisita e tenho um potencial imenso para deixar tudo de perna para os ares. Eu bebo, choro e sorrio ao mesmo tempo, às vezes grito, mas raramente falo pouco. Sou prolixa e consigo escrever ainda mais. Tenho uma Olivetti verde. Para os nascidos no século XXI, Olivetti é uma máquina de escrever. Eu costumava escrever usando-a, era mais prazeroso quando eu precisava rasgar o que havia escrito. Raramente volto a ler o que escrevo. São momentos tão íntimos que não merecem mais do que um momento de atenção. Eu nunca coloco meus escritos onde exponho claramente minhas outras coisas. Uma questão de mania, apenas mais uma, assim como roer todas as unhas até o advento de unhas postiças para meu mundo postiço. Adoro pintura. Pintei um único quadro aos dez anos de idade, um marinheiro. Minha mãe ainda o guarda e eu ainda amo pintura. Só não arrisco mais... Sim, também desisto facilmente. Empolgo e desempolgo em um piscar de olhos. Olhos míopes, o pior dia da minha vida foi devido a eles; não exatamente a eles, mas aos óculos que usava. Eles eram coloridos como metade dos meus dias: vermelhos. Mas, eu bebo, choro e rio ao mesmo tempo, e geralmente, perco coisas, pessoas, amuletos; nesse pior dia da minha vida, perdi meus óculos vermelhos. Tenho comigo que eu bebi suas hastes até que a necessidade de ver as pessoas na rua desaparecesse. Hoje, não uso mais tais lentes, prefiro não ver o que a maioria vê. Enxergo do tudo meu jeito. Não gosto de perder. Escondo boa parte do jogo, a outra restante, não vejo. Não gosto de dias ensolarados e pessoas efusivamente felizes. Felicidade, então, é o que, certamente, poupou-me o pior dia da minha vida, como registrei, bêbada, em minha Olivetti verde e depois, calmamente, chorando e sorrindo rasguei como quem apenas sente um cansaço imenso diante do nada. Olha que havia muito ali, muito preto no branco, poucas cores e a ausência de saudade. Sou ausente: de mim, dos outros, da ausência. Achar-me, ou explicar-me, é ver metade de um jogo e negar a outra (já disse?). Colorir e descolorir. Empolgar e desempolgar. Ousar e recuar. Dualidades instantaneamente mutáveis. Não quero ser muito importante, mas quero fazer uma descoberta intelectual marcante. Não espero muito da vida, nem quero me vender, mas tenho um gosto acentuado por situações efêmeras. Mudo de opiniões (minhas...) facilmente. Sou teimosa, voluntariosa, orgulhosa e romântica. Não tenho paixões, vivo de amores, a escrita, por exemplo, até certo ponto. Pronto... até aqui.

Se pudesse, rasgaria esse texto. O delete não é tão charmoso quanto o desequilíbrio transbordando pelo cansaço de mudar tudo para continuar como antes. Ponto.

terça-feira, 15 de julho de 2008

Eu vi e quis ver. O que eu vi, só eu sei. Só eu temi pelo que vi e senti... Defendi a mim com palavras ásperas que não passam de argumentos para eu não me entregar. Neguei, relutei em dizer que não vi, quando via, sim, algo diferente. Demorou tanto para concretizar, somos filhos do acaso. Entre tantos desencontros por que não? Existe um mundo tão vivo do outro lado, algo novo e tão diferente dessas minhas tempestades.

Da necessidade que dizia, fiz procura, sim. Procurei e procurarei, pois tenho fé. Minhas lentes míopes, desbravadoras de clarezas e escuridões, farão minha travessia, mas não as deixarei ser o meu fim. Se pudesse confessar, diria que beijei-lhe a testa, e o que previ foi a minha fraqueza ao pensar em desistir. Em oração deixar-lhe sem mais. Confessaria também que nada se moveu, realmente; havia suplicado por algo errado: mão única, sem pensar que é uma exigência e, amor exigente em qualquer esquina faz morada. Não! Se tiver que ter fim, terá quando for a hora exata (talvez agora após essa bela demonstração de fraqueza).


Mudo de discurso porque dói-me ser assim, mas sendo-me o jeito é aceitar e tentar acertar nas mãos de cuidados. Deixa... deixa que aos poucos esse adulto triste e sozinha vai embora, na brisa... Deixa... o silêncio traduzir o que eu não conseguirei explicar. Deixa serenar... eu estou a procura e eu vejo, tendo ânsia pelo eterno.



Shhhhhhhhh. Tem algo acordando aqui... Veja!

segunda-feira, 14 de julho de 2008


Eu não estava procurando, mas vi. O que vi? Não. Estou cega de organização. Mas eu vi. O que eu não estava procurando quando vi é, na verdade, o que nego. Hoje, nego através do “não estar procurando”. Por que estava procurando? Sabia bem como era ter, e uma vez sabido, vagaria atrás do correspondente. Eu já sabia e isso não é exatamente uma procura, até mesmo porque eu não procurava, mas vi. E vendo não posso mais me cegar. Reluto, dizendo que não vi? Bobagem. Não vi, mas tenho uma imagem colada na retina o que inconscientemente vai me forçar: Pronto!

Era possível. Mas, eu fiz que não. Essa espera por correspondência não é procurar; é uma necessidade. Tenho miopia e minhas lentes estão cada vez mais espessas. Contudo, venho abrindo passagem no escuro. Não quero buscar iluminação. Tenho lentes, colocando-as frente à escuridão, consigo desbravá-la; escuridão alguma é mais espessa que minhas lentes míopes. Não há necessidade de luz, ao passo que ao confrontar a luz, também com a espessura das lentes, seria constatar sua fragilidade: o claro cega e, da mesma forma que o escuro, pode ser facilmente vencido pelas lentes. Tenho medo conhecer essa invencibilidade: desorganiza-me. Busco correspondência, não procuro desvendar. Como é possível isso? Mesmo sem procurar, ver através de lentes míopes que querem correspondência. O que fazer com o a possível imensidão eterna que dizia, se sei do claro e do escuro e não pertenço a nenhum? Dessa organização que me assusta deve sair um novo modo de me explicar. Sim. Explicar, porque estou longe de sentir a vida. Há prazos para o meu sentir, eu vi! Soube que ia terminar, quando eu começasse a conhecê-lo. Quis agarrar-me àquele fio de sentir que eu começava a detectar, inutilmente. Eu o veria e ele teria fim, pois eu havia procurado. Eis o fim. A procura do que eu não tenho controle é o fim? Talvez a busca... Neste ponto, novamente, não me valeria claridade ou escuridão alguma: vou chegar a realidade somente com a minha morte, antes estarei em sonhos. E preciso de uma nova vida inventada porque eu vi, mesmo cega pela organização; é tão finito, é tão frágil e inanimado.

Beijei-lhe a testa. Confesso: rezei. Suplicando, pedi que movimentasse algo para que eu pudesse ter certeza que não havia tido aquela previsão. Uma antevisão do fim abdicava a chance de me tornar mãos de compreensão. Beijei-lhe a testa em oração, para que se eternizasse em mim algo próximo a algum sentir. Nada se move, é finito - não me assusta ou me faz querer mais. Não me toca. É frágil e passageiro. Nem em oração mudou o que vi, mesmo sem procurar. Não vendo felicidade, via, ao menos, momentos de alegria instantânea pela qual, agora, vou me tornar amorfa. Vou me desorganizar, por algo que não me é necessário? Na organização estou tão longe dos limites que me farão sustentar esse “entendimento” amanhã. Serei um quê qualquer de vento que não dará forma, mas que me deixará mais delicada.

Vou chover. Tenho admirado o estar vivo inumano e sorrido para o eterno que acabo de tornar passageiro da matéria. Se me chegasse vida feita para ser amor e compreensão, aceitaria e a deixaria fazer morada. Mas não sendo, não posso tal permissividade. Veja, busco o durável para explica-me, já que não consigo não me conhecer.

sexta-feira, 11 de julho de 2008

O mundo dentro, em mim.

Escrever, no caso, para adultos, é a forma de se comunicar com a legião estrangeira que nos habita ao fundo, já diria Lispector sobre chegar ao íntimo do homem com as palavras. Na impunidade do anonimato e na habilidade em tocar fundo, assim como as palavras, acredito que há, também, o sexo. No esfregaço dos corpos, no molhado do suor, nos movimentos tenazes de lábios, línguas, mãos, transborda-se o mais profundo do homem: toda sua animalização, instintos de sobrevivência, ali, jogados em vinte minutos de danação terrena. O que nos toca fundo, transborda-nos. Deixamos o Superego das máscaras sociais para deleitarmos com tudo o que o Id nos presenteia. O sexo e as palavras, mecanismos dúbios de gratificação e punição singulares. Ah! Certamente não há nada que se compare com a sensação de gozo da conclusão de alguma produção textual ou dos desejos. Sensação seguida de uma morte momentânea, onde se quietam as bocas e mãos, corpos e mentes; um hiato até que a necessidade de se desfazer das meigas caras do dia-a-dia fizer-se insuportável; despindo-se, assim, dos recalques. O toque do outro, compatibilidade de pele, do mesmo sabor nas bocas e o brincar magistral das mãos é a ponte ao corpo nu, à matéria pura - essência animalesca que fissura; e que, sem controle, nos leva ao que somos. Se escrever é arte de se encontrar, e arder em par é um encontro ainda mais sublime... o que somos?

quarta-feira, 9 de julho de 2008

Do retorno. Do que move. Do que constrói.

"Amar é metade de crer."
(Victor Hugo)

O impossível mais uma vez nos salta aos olhos. A força nascendo de onde menos se espera, do frágil, transformando banalidades em fé. Ou ao retorno a fé, ou a nunca ter perdido a fé nesta dualidade (sim, edipiana – justificaria muita coisa, já pensou?) Mais uma vez o cuidado potencializa a existência. A espera deixa seu caráter ansioso e passa a um estar certo, às vezes, reduzido em “tem que vai”. E vai! Porque a normalidade amarga envelhece. Porque não seria tão prazeroso se não fosse improvável. Porque a instabilidade é caleidoscópica e a cada minuto uma nova explosão de sentidos nos salta aos olhos. A única premissa ad eternum é amar nos detalhes, como ninguém mais sabe (claro, como o impossível, às vezes, se realiza... Quem o conseguir será, também, de um sentimento inominado). Cuidado simples diário que torna o simplório um andarilho, que depois deste encontro, da junção dos nossos umbigos, está muito, muito, muito longe de nos alcançar.

"Os corpos apenas têm o abraço, as almas têm o enlace."
(Victor Hugo)




segunda-feira, 2 de junho de 2008

“Eles passarão. (...)

Ela confere ansiosa o relógio pensando como era incomum aquele atraso de meia hora.Contrariamente ao que tentava transparecer, desejava que, por aquela porta, ele entrasse, puxasse a cadeira ao lado para se sentar e fizesse, ali, os gestos que lhe presenteava quando estavam seguros. No quadro, mais uma apresentação tosca de algo tosco por alguém não surpreendentemente mais tosco ainda; uma sobreposição de conhecimento que, sem mais, a irritava, assim como essa obrigatoriedade de ficar quieta, inerte, apática e semimorta, a espera da grandiosa luz do saber, que por mágica, certamente, adentraria sua caixa craniana pensante sem menor esforço. Durante esse compenetrante movimento da luz, ele entrou com passos firmes, apressados e imensamente vermelhos – diziam roxo, mas ele entrou vermelho; oscilando em fazê-la vizinhança ou não. “Meros sorrisos tímidos de companheragem”, pensava ela, enquanto, já há alguns quarto de hora sem voltar o rosto para a figura dele, resolveu mover-se totalmente em direção a ele. Bobagem qualquer que chamou a atenção de outras pessoas para a micro-explicação que, a princípio, era somente para ele. Para ele... Para ele que, naquele momento, voltou toda a sua máster-explicação filosófica para outros. Palavras e mais palavras. Como eram imensos aqueles verbos cambaleantes na boca daquele homem. Articulava bem as idéias, expunha-nas sem medo do quão nocivas poderiam ser. No meio daquela explicação, ela o desenhava em mente: selvagem, como qualquer animal acuado. Essa seria a caracterização para ele, um ser-animalesco-oralizado. Desenhou novamente uma imagem para ele, agora, minguante. Ele sumia lentamente da imaginação, via-lhe a boca mover, dela saiam a essência de muita coisa, que não ele, propriamente; e isso fazia que ele evaporasse do pensamento, mesmo estando ali, frente a frente. Como um soluço ou quem sabe a penetração da luz, ela soube da verdade: mesmo entre os poemas e arames no local seguro, na vida real, existiria sempre uma distância infinita entre eles. Os poemas eram camuflantes da realidade, ali, descoberta por ela e que cada dia mais a libertava (dela mesma e deles): eles eram apenas desafio um para o outro, nada mais.

(...) Eu passarinho.”

domingo, 18 de maio de 2008

"Esquadros"

”isso de querer
ser exatamente aquilo
que a gente é
ainda vai
nos levar além”

(Paulo Leminski)





Passei 922 dormindo, submersa em um sonho. Mal sabia eu que sonhos não se dão, sonhos são embriagáveis. Dormi por esse tempo todo em algo que eu criei em areia, como uma vida, bastando a si mesma, fora do (meu abominável) normal. Se em meio ao sonho viessem planos, os sentia em cada detalhe enquanto me tocavam e por vezes me tocaram. Dizia a antiga-menina-eu para a nova-senhora-eu que era assim porque era; o sentir supera boa parte da podridão. E foram 922 dias entre acordar, sonhar, intercalados por uma espera sem fim, onde a palavra ganhava ares de metáforas, o corpo ganhava apenas mais um toque relapso e o que fica atrás do meu pensamento conformava-se em uma não paridade: “solitude”.

O que se passava nas magias sensoriais eram ilusão de uma complexidade surreal, enquanto em meio ao que se é, de um outro lado da cidade, ao alcance dos meus olhos, os detalhes simples corriam, sem que eu os percebesse. Ontem, for fim, o fiz: estômago embrulhado e uma epifania. O mundo de súbito se apresentou para mim novamente enquanto meu eu orgânico implorava-me atenção. Doía-me o estômago, doía-me o sentir que nunca pôde existir e naquele momento ainda doía-me a verdade. Consolo-me, eu por mim mesma, ao saber que o dormir passou, deixando esse rastro de vida despertando... Volta a mim, suavemente, minha alma como pássaro em vôo entre cerrados, desertos e ares, novas ares das "infinitudes" e simplicidades de ser exatamente aquilo que se é.


domingo, 11 de maio de 2008

Feito sopro


Por vezes, então, anéis quebrados e maravilhosas antiguidades perdidas e nada mais a ser feito, ei-lo: o inesperado. Tocando-a pela face o perigo das noites grávidas de elegantes sorrisos regados pelo arrepio correndo o corpo a gritar a vontade de corresponder àquela boa nova. Faces, instrumentos e sentires que podia, libertar é ser simples, mas a tornava imensa ao talhar detalhes inesperados desse mistério e doçura. Agora, sim, mais uma vez, como tudo que voa por ai, a única coisa que a espera é exatamente o inesperado. Ela corre perigo, um doce beijo de flor. O inesperado de cada pétala e o momento esperado da doçura em tocá-lo. O perigo... o perigo e a simplicidade dos momentos inesperados...
Nada mais se tem a fazer quando não se recebe doação em resposta a sua entrega. Não, sabe-se, exatamente, quando o afirmativo apresenta-se, em entrelinhas, como uma negação. Uma não entrega consumada ou feita pelas metades nas doçuras dos dias, dos fluídos, dos corpos. Nada mais se tem a fazer quando pela última vez ela apertou contra o peito aquela coisinha, tendo-o como intocável, vendo sair aquelas palavras que no mais diziam o que ela não queria ouvir. Eles haviam protelado o fim, consumado, agora, na doçura de um momento cavado. Ela come a luz.
Ela come a luz e nasce de dentro dela a liberdade... Não há nada mais a se fazer.

domingo, 4 de maio de 2008

Irracional...

Talvez ...

"Talvez não ser,
é ser sem que tu sejas,
sem que vás cortando
o meio dia com uma flor azul,
sem que caminhes mais tarde
pela névoa e pelos tijolos,
sem essa luz que levas na mão
que, talvez, outros não verão dourada,
que talvez ninguém soube que crescia
como a origem vermelha da rosa,
sem que sejas, enfim,
sem que viesses brusca, incitante
conhecer a minha vida,
rajada de roseira,
trigo do vento.
E desde então, sou porque tu és
E desde então és
sou e somos...
E por amor
Serei...
Serás...
Seremos..."
(P. Neruda)

sexta-feira, 2 de maio de 2008

Fundir. O tácito ao vivo. Romper paradigmas das subjetividades. Fundir-me em algo que possa ficar na terra. Cortar o gás. Inebriar ou matar-nos com estes... Fundir-nos, nas banalidade diárias. Ela e eu. Eu e eles... O beijo e a boca, corpos e espírito, delicadeza e rudezas. Não plenitude dos verbos com a intransigência dos mesmos. Fundir-nos; o que acreditamos com o que somos. Ou o que não somos ou, ao menos, o que não podemos nunca ser.

Ficando para o sempre-agora, no ar...


Fundir-nos, senhor. Deus-homem, figura imaculada. Leve de mim toda a castidade... Absorva-me em despudores, funda-me neles, nos outros e em outros tantos. Não deixes nunca o caminho vão. No ar, meus senhores, deixe-me, pois, é de minha única responsabilidade. Não me funda, Senhor, no que não acredito. Funda-me, intransigentemente em oração, ao não humano. Funda-me na boca, o toque e, nos dedos, os ares...

terça-feira, 22 de abril de 2008

Aterrar

Vivo mergulhada em um eterno sono, quando vez ou outra, ou sempre, um ser me acorda. Levanta-me pelos cabelos, fazendo-me sair do conforto para o confronto entre os meus eus e entre esses eus e os homens. Deste confronto restará obviedades e contra-pontos dos meus debates que renegam, ainda, a velocidade das coisas frente aos confortáveis sonhos. A normalidade não me assusta da maneira como eu e minha selvageria visceral conseguimos assustar os homens. Aterrar. Restar-me, parafraseando C.Veloso, ser o lobo do lobo do homem.
Então, venha-me, que já estou desperta!

domingo, 30 de março de 2008

E você me toma os pensamentos mais uma vez e me corrói e me possui com um vigor que nunca ninguém pôde imaginar, surpreendendo até a mim, que achava ter passado por algo semelhante e inclusive ter superado sua insensatez. Mas, não. Você ainda grita dentro de mim a beleza dos seus poucos anos, seus pensamentos mais doces em contraste com todas suas palavras de ordem. Quando falava a você sobre a paz e contra a agressividade, queria dizer da minha vontade reprimida: agredir a mim, por me deixar possuir e pensar que isso só passa comigo e por ter vontade de gritar, assim como você faz na minha cabeça o dia todo, que eu não concordo! Essa minha permissividade é mentira. Detesto pensar em dividir você, pensar em não estragar e pensar em perder sem ter feito algo de errado. Aliás, fazendo, por duas vezes as coisas convencionalmente certas. Pura mentira, também. Sempre fiz tudo errado, mesmo que por pensamento. Mentalizei muitas flores, sim. Mentalizei ainda mais estrume. Não acredito em vocês, pessoas. Acredito que a qualquer hora, vocês, pessoas, e você que não fez nada além de me atormentar por meses e meses e meses a fio irão me decepcionar. Então, visto-me de delicada. Teria você, dono de toda uma fala sabiamente coesa, coragem de me perceber como o que há dentro? Não. Não teria por ser fraco e por estar ainda nos meus pensamentos, o que me faz querer parecer com você, minha grande mentira para a maldita “afinidade”. Comprei a afinidade, li as coisas certas, escutei suas músicas, partilhei o meu corpo, como você tanto disse. Menti para mim, para você e para os outros. Hoje percebi a gravidade de me permitir, estragando não a mim, mas aos outros com nossas promessas que não serão cumpridas. Os outros, rapaz! Os outros, tão bem mais resolvidos, como você disse e como acreditei - nossa mentira. Digo, então, que me fecho. Andarei, por ora, com as mãos amarradas para trás, não vou tocar em mais nada. “É porque é. É porque é. Não há desespero em vão”. Não... Eu terei asas!

quarta-feira, 19 de março de 2008

das datas. de um parto vazio. de gente vazia.

"Deus, proteja o filho teu.
Não deixa o mal ganhar.
Por onde se escondeu
enquanto o céu caiu?
e a chave não abriu
e a estrada se acabou
e a ponte não passou
pra lá desse lugar."




Deus! Se te questiono é porque te quero bem. Diga-me, por onde você vais, agora? Escondendo por trás de armaduras, expondo-se pelas rugas e pelos cabelos grossos e brancos. Cabeça tomada por uma brancura... de idéias, ao menos idéias divergentes às minhas. Se sentes vontade de fuga, foges sem me deixar questionar. Criou-me (ou criei-me?)... no meio dessa brincadeira, ensinou a mim que esse cuidado era uma premissa, sem saber de em suas ‘aventurâncias’ futuras, este conceito não caberia. Não cabe também eu acreditar nessas ‘aventurânicas’, cada vez mais expostas pela armadura de rugas – mais uma divergência. Questiono: foges de quê? Estás sob seus olhos o que há de errado, se existir realmente algo de errado do lado de fora, e a decisão é sua, não posso questionar isto. Dizes tanto e de forma tão rasa que quando nunca me questiona é porque me quer bem, mas são palavras... rasas. Deixa-me livre, eufemismo para dizer que me quer desprendida de você. Não sabes, mas hora sim, hora também, necessito de interrogações ou de uma armadura verdadeira de rugas; que possa permitir que eu crie rotas de fugas alternativas do que eu, certamente, diria não ser meu lugar. Lugar que cada dia mais descaracteriza um lar, porque há fuga minha e sua. Eu te quero como não és. Queres de mim algo que não posso ser, por querer-te como referencial. Vejo-me em ti e nossos rostos fecham devagar, nossas bocas emudecem sem perceber. Perdemo-nos... E não adiantará o amanhã e o “esforço para lembrar (a vontade de esquecer)”. Sabe? Não me compras. Não necessito de escambos, sou livre dessas coisas, vale-me o que há por trás, que você sempre justifica – como se pudesse justificar a falta que me fazes, dizendo que somos de uma matéria só – mentira sua para mim, que eu finjo acreditar – mentira minha para você. Vais, porque necessita fugir de você. Mas, sua volta está velada, voltará aos mesmos ais, que são também meu ais, mesmo que sejamos de matérias diferentes... Como podemos ser tão estranha uma a outra se sou seu desdobramento? Acho... não, estou certa que seu ventre ao me parir estava oco.

domingo, 9 de março de 2008




Eles estavam um no outro, naquela madrugada quente. A rua deserta fazia fachada para tolices, enquanto caminharam de mãos dadas até a esquina. Foi ali, exatamente naquela hora, que, displicentemente, as mãos se soltaram. Ele não tentou pegá-las, ela fingiu que não sentiu. Os olhos se viram. Os braços oferecem achego, mas as mãos não se tocaram... Ele se virou, ela permaneceu parada. Ele deu o primeiro passo, ela petrificou-se. Ele fazia-se costas, ela abaixou os olhos, levando-os ao chão. Ali, bem ali, na madrugada quente, criou-se duas novas vidas separadas por um buraco gelado, aberto aos pés e dentre(o) (d)eles.

E teria a brisa quente levado a figura desse bonito a perder no horizonte, se não fosse a necessidade de deixar tudo sereno, traduzindo o encolher dos ombros e, já, lá longe, no virar da cabeça, o último olhar de palavras rompendo o silêncio compreendido.
Aquela noite era apenas mais uma noite quente, sem chover....







quarta-feira, 5 de março de 2008

Palavras retirantes...




ou... Algo do tipo:

“Entretanto sou incapaz de dizer o que é que eu quero, apesar de ansiar pelo que espero de alguma forma secreta. Pois muitas vezes, e com freqüência cada vez maior, a medida que o tempo passa, dou comigo de repente a interromper minhas andanças, como se eu fosse paralisada por um olhar estranho e novo sobre a superfície da terra que conheço tão bem. Um olhar que insinua alguma coisa; mas que se vai antes de eu perceber seu sentido. É como se um riso nunca visto furtivamente se estendesse num rosto bem conhecido; por um lado dá medo, no entanto, por outro, ele nos faz um sinal”.


(Contos Completos – O diário de Mistress Joan Martyn – Virginia Woolf).

quarta-feira, 27 de fevereiro de 2008

Você nem é passarinho....




... porque então que você tem que passar?

domingo, 24 de fevereiro de 2008

Na casa, vazio.

Na cama, eu. Sem música. Sem flores. Sem janelas. Se cheiro. Sem pele. Sem gostos. E sem tempo.

Na mão, cigarro. Sem trago. Sem jeito. Sem pensar.

No vazio, tragos de nada. Mistura de coisa nenhuma em boca seca e explode:

Todas as promessas que não cumpri. Palavras que inventei para deixar a casa mais bonita. Momentos que parei o mundo para ir além sem saber que o além estava aqui, dentro. Ridículo; exposição ridícula de palavras bonitas, jeitos letrados ofertados sem piedade na feira virtual. Antropófaga. Canibalismo de idéias compradas por socialistas. Comer por interesse, não simplicidade. Pular do nutrir para sobreviver: ... Luta canibal para que algum dia alguma coisa faça um ínfimo sentido.

No nada ao nada.

Ao nada do nada.

Em um mísero cigarro de uma não fumante.


----------------------------

Trilha sonora de sussuros:
“Não se pode negar sua a natureza”.

quinta-feira, 21 de fevereiro de 2008

"Dentro das cinzas das horas..."

"Entre por essa porta agora
E diga que me adora
Você tem meia hora
Prá mudar a minha vida
(...)

(...)
Vem, vambora
Que o que você demora
É o que o tempo leva..."
(A.Calcanhoto)
Eu que nunca mais me imaginei, assim, vestida de juras momentaneamente eternas e belezas insanas. Eu que não mais imaginava ficar sem fôlego para controlar o pensamento que teima em não ficar aqui ou que fosse ver um olhar como o que vi, quando eu fingia estar distraída com um papinho bobo, em um momento bobo de qualquer sexta-feira boba. Não. Eu não mais imaginei que ficaria aflita com a falta de contato e estressada com o celular que não toca. Tudo bem. É, está tudo bem. Mesmo que não estivesse – porque está tudo bem, eu fingiria que é, está, sim, tudo em calma, e eu não preciso de pressa. O sentir é construído, eu aprendi com os tombos que andei tomando. E eu falo com tanta convicção que tenho domínio sobre os sentimentos, que posso deixar para contar, só no próximo encontro bobo, que eu descobri que o cheiro dele é cheiro de madeira. Madeira que se entrega ao fogo com uma facilidade tamanha; porque ele, cheiro de madeira, não?
Agora, vulnerável, como não esperava estar, posso esperar dias inteiros para contar detalhes da minha vida ou para ver um sorriso meio constrangido com a minha eletricidade. A vida anda tão absurda e eu preciso contar isso, mas eu espero e contenho o desejo de querê-lo todos os dias à noite, sentado no chão, com os cotovelos sob os joelhos e as mãos fechadas próximas ao rosto, só para ver no segundo seguinte elas virem despretensiosamente em minha direção, me puxarem pra perto e tocarem minhas costas enquanto eu o ouço falar alguma barbaridade brincalhona que virá acompanhada de um sorriso de desculpas... Ah! Eu que nunca imaginei perder o controle, nem que voltaria a sentir isso, desmorfo me invadindo, me amedrontando segundo por segundo, deixando-me ‘pseudoeternamente’ instável, buscando todos os dias um encontro simplesmente bobo com a intensidade de uma vida sem pressa...
Sem pressa.

sábado, 16 de fevereiro de 2008

“A beleza ainda é mais difícil de contar do que a felicidade.”
(S.Beauvoir)

Razão deveria ser dada como objeto de empréstimo. Sim, só isso me salvaria agora. Principalmente porque venho tentado falar dessa beleza que me fez morada levando o nada racional que havia me possuído. Inevitável não pensar, inevitável não ver a insanidade que há nessa beleza e que transforma o meu nada em tudo e meu tudo em nada em um segundo. Em um olhar, a boca seca, as mãos suam, os pudores são levados com o cheiro e o corpo estremece por completo na ânsia de ser acalentado por braços de abraçar e lábios de beijar desejos sem fim, cessando qualquer pensar racional. Toda essa beleza passional sedenta de tomar-me, inteira. Eu, fragmentos catados um a um, até formar figura de Marina para caber ali, bem ali, onde antes nunca pude imaginar e agora, não posso imaginar que exista algo igual. Céus! É de uma beleza estonteante e de uma alegria triste... Mas eu caibo, exatamente ali, ouvindo todas as sandices e todas delicadezas, contrapondo a normalidade, fazendo-me contradizer o meu desgosto por acasos. Ai, céus... Não há desagrado ou raiva que perdurem. Levito-me em fragmentos de beleza insana que, definitivamente, faz-me perder!

Trilha sonora:

“What magic words would capture you
Like a soft evasive mist you are Bonito*
You fly away when love is new
What do you ask of me Bonito*
What part do you want me to play
Shall I be the clown for you Bonito*
I will be anything you say, Bonito*
Don't run away Bonito*”

Bonita (Tom Jobim – que deveria ser “Bonito”, mas...)

* - Original: Bonita. Alterações minhas.

domingo, 10 de fevereiro de 2008

Eu nasci em 04 de fevereiro de 1987, (provavelmente numa) quarta-feira de cinzas, exatamente ao meio dia em Belo Horizonte ou em janeiro de 2006, durante o meu recesso. Eu precisava de férias das agitações internas e pensei que havia encontrado, finalmente, meu sossego ao acaso. Nestes tempos longínquos, eu fazia escolha. A vida acontecia no singular com toda a singularidade que lhe era permitida. E foi assim que no jogo com o acaso, eu perdi tudo. Eu, que nunca soube como dar as cartas, fui derrotada por uma única carta, começo do meu fim... Ciclos que se renovavam nos escritos, consumia-me o pensamento, mas fez reforçar um outro encontro - este às claras, mesmo tão ‘stranger’- onde era permitido falar das minhas dores; uma a uma escutadas e cuidadas. Nessa época, muito próximo do dia que eu morri, consegui desprender o afeto, o intelecto e o companheirismo da sexualidade, eles viriam como amizade. Não seria uma ligação direta, era afinidade, amizade, pureza; somente na véspera de minha morte, pude perceber isso. Então, também em uma quarta-feira de cinzas, eu finalmente morri. Deitei-me de encontro ao nada. Subi mais alto e vencendo a indecisão suicida, joguei-me. Se não encontrasse a luz, vagaria nas linhas brancas do nada, mas com a certeza que seria velada por mãos de cuidado.

Pobre de mim! Quando planava, fui poupada do tocar no chão. Havia uma mãozinha, que ao invés de se fechar em oração, abriu-se e, espalmando-se, esperava-me, amenizando minha queda... Mais uma vez eu me senti protegida pela mágica do sentir puro. Fiquei dentro dela, meu casulo pelo primeiro instante. Quando forte, as mãos se abriram e eu pude, finalmente, voar. Borboleteie em ares letrados e indecifráveis, mas que me faziam sonhar e sonhar e sonhar, relendo os clássicos, os mitos e os paradigmas... Como os clássicos, os mitos e os paradigmas esses ares permanecem na atemporalidade da história. Serão sempre os ares dos ares que não meus e fim – até a paradoxal relação amor-ódio passar. Em um desses momentos, as mãos já conhecidas me esperavam... Antes mesmo da escolha de pular, elas estavam lá. Não no sopé do abismo, mas no topo, junto a mim, em uma ligação horizontal. E elas me pediam delicadamente para me deitar em sua palma... Era hora do cuidado – meu casulo pelo segundo instante eterno. Morta, vagando nas linhas brancas, preparando-me para mais uma mutação.

Pois bem, nasci duas vezes, morri uma única, vaguei sem fim pelo clássico inferno divino e, mutante, batizei-me, Beatriz. Como Beatriz, forcei as mãos, precisava do palco: atuar. As mãozinhas receosas abriram-se para eu sair desmorfa – meio bicho arredio, meio doçura. Teimosia, um das forças motrizes, fazia-me seguir. Oras! Morrer já não era mais temido, eu já estava morta. O jardim, onde tentava achar morada, havia ressecado quando foi necessário o primeiro instante eterno. Não havia nada a temer, nem a perder e se o jogo havia intrigantes adversários, porque não jogar? Colocava na mesa apenas as cartas sem muita validade, deixava uma na manga e blefava, encarando-os com tanta determinação que ninguém duvidaria da minha habilidade inventada – a minha atuação aprendeu mais uma arte, a arte de sofismar. Se doía-me (e doía-me...) saber que, por vezes, eu queria, sim, consumir todos os adversários, inventava que não. Mas, o que eu mais queria era que rebelassem-se e saíssem desse curta metragem independente no pior estilo “cassino sul americano” e movimentassem-se em cores reais, toques reais, vontades reais. Descobri, por mim, que mesmo o melhor sofisma, não passa de uma “realidade inventada”. Ah! Eu, vezes e mais vezes, citei Lispector e a nossa afeição por elas; agora, eu não mais os queria. À noite, no breu, repudiava inventar realidade. A realidade desejada era Nino de A.Poulain e os prazeres da pequenas coisas, palpitações e, se assim fosse, não me importaria idade, clássicos ou egos verdes incandescente que me mataram. Nos jogos, perdi pouco do concreto, mas muito de mim; perdia-me aos poucos, afundando-me em “be atriz”. Em uma única noite, no breu, com vistas cansadas vi lá longe um poema acender sua luz:

"Apaga a luz
Antes de amanhecer
Um vagalume"
(Alice Ruiz)

Um vagalume(zinho...). Que eu já havia visto, mas nunca percebido. Meus olhos cobriam-no de primeiras impressões. Mas em meio às fortes luzes natalinas e todo o clichê de final de ano, ele apareceu pequeno, indefeso, poético em sua sinceridade, em suas cenas de territorialização gratuitas e com sua luz fraca, mas autêntica. Um poema curtinho, que seria minha morada, por ora. Do poema curtinho, fez-se, também, “Brinquedo Sério” (Alice Ruiz).

Meio borboleta, meio bicho. Ora Marina, ora Beatriz. Clichês e autenticidades. “Palavras e silêncios”. Metade mim, metade outros. Carnaval e quarta-feira de cinzas. Meus paradoxos nunca terminariam... Na indecisão, as horas consumiam as poucas horas de luz e ensinavam-lhe os truques do jogo, que eu já não suportava. Eu queria mesmo sedas para descansar, mas minha não habilidade em conseguir arrancar os prefixos da indecisão fez com que o dia despontasse (o que eu sempre quis, mas não agora). Querendo que a noite continuasse a destacar a luz do bicho – eu ainda quero tanto, mas tanto que até me envergonho! – pedi abrigo às mãozinhas. Ontem, enquanto revia as gavetas, limpava a casa e molhava minhas flores-amores de plástico, sentindo-me ridiculamente envolvida por mais uma viagem sentimentalóide, pedi para que as mãozinhas me fechassem em cuidado... e lá estavam elas, fraternalmente. Mesmo sabendo que a antiga Marina morreu, fingiu renascer, mas não conseguiu. Elas lá estavam, fazendo-me nova: Marina sem codinomes, recriando heranças, minhas flores, meus jardins e desenhado a vida, e o sentir com pureza. Mãos em liberdade, mesmo quando em casulo. Hoje, o meu terceiro instante eterno. Obrigada, sempre! *=)




PS: Tô estragada... Reze para não parecer muito “nhé” essa fábula(zinha) água e açúcar ou para não ficar 1/2! Só posso com suas orações. Ah! Você sabe... * “Relicário” * (Nando Reis).

sábado, 9 de fevereiro de 2008

Tudo novo. De novo... mais uma vez (e até dar certo...).


Tendo A Lua (Os Paralamas Do Sucesso)

Hoje joguei tanta coisa fora
Vi o meu passado passar por mim

Cartas e fotografias gente que foi embora.

A casa fica bem melhor assim

O céu de Ícaro tem mais poesia que o de Galileu
E lendo teus bilhetes, eu penso no que fiz
Querendo ver o mais distante e sem saber voar
Desprezando as asas que você me deu

Tendo a lua aquela gravidade aonde o homem flutua

Merecia a visita não de militares,
mas de bailarinos e de você e eu.

Hoje joguei tanta coisa fora

E lendo teus bilhetes, eu penso no que fiz

Cartas e fotografias gente que foi embora.

A casa fica bem melhor assim

Tendo a lua aquela gravidade aonde o homem flutua

Merecia a visita não de militares,
mas de bailarinos e de você e eu.

Tendo a lua aquela gravidade aonde o homem flutua

Merecia a visita não de militares,
mas de bailarinos e de você e eu.

quinta-feira, 7 de fevereiro de 2008

Sem destinatário certo: Ao acaso e a quem couber...



Digam o que lhes convier, mas a premissa está posta; tanta casualidade, isto é, em número excessivo, e pouco encontro. Diversos, cada qual com sua peculiaridade, convergem, apenas, no desamor sentido no depois. Agora, se fosse permitido, diria da necessidade narcisista de correspondência. Não tão egoísta como certamente soará; seria dito de forma simples sobre a necessidade de ‘responder’. Malditas expectativas que consomem em toques, cheiros e saliva! Esperanças que chegam, mesmo que tarde, para apodrecer no magnífico nada. Dentre pertencer e mentir que o faz – que o sente – seguir, por não haver outra opção e por teimosia, como lágrima estancada nos olhos a espreita de mais um nada, mais um engano sem responder e, menos ainda, corresponder.

Haverá dia melhor com hora certa de tornar-se livro e leitor insaciável, quando cada palavra posta ganhará ares de imaginação, libertando-se da intenção do autor, ‘sendo-se’ gramaticalmente cabível, mesmo que não tão correspondente a ela (ou não...). Um dia... Hoje, não!

Hoje, árvore no chão, página arrancada, papel picado e fogo a consumi-los...

Trilha sonora: Palavras e silêncios – Paulinho Moska.

domingo, 3 de fevereiro de 2008

Solilóquio

É... eu realmente odeio carnaval. Imagina só cidade do interior uma hora dessas, 22:50h do domingo de carnaval. Vai faltar água, a cidade vai estar imunda e os axezeiros estarão consumindo com seus neurônios. Beleza, Marina! Você odeia carnaval, mesmo. Nunca gostou. Isso repete três vezes: odeio, odeio, odeio. Deu pra enganar. Mas, uma hora dessas em Belo Horizonte... é, os anti-folias. Mas, onde eles estão? Que porcaria é essa de cidade vazia. Ninguém me irritou hoje no trânsito. Que trânsito? Trânsito dos anti-folias raptados pelo maldito crééééu. Isso! Abriu um buraco e créééééu na galera. 22:53h e eu odiando todos os tipo de carnavais, inclusive o “anti-folia”. Pois é... Pelo menos às 22h em ponto você tinha companhia, ô vinhozinho de merda. Merda, merda, merda. Três vezes para eu acreditar que estou bem, está tudo certo, eu odeio carnaval mesmo e esse vinho ainda não subiu, não deu tempo. Mas as cidades do interior... pois é. É... esse computador cheio de fotos. Dá uma doidera ver fotos antigas. Dá uma doidera maior ainda ver essas fotos que fazem as pernas tremer de vez. Ai, bosta de cidades do interior! Aposto que lá não tem vinho. Mesmo esse vinho de merda que ainda não subiu, e essa foto faz tremer e as malditas cidades com nomes duplos. Odeio. Odeio nomes compostos de todas as formas. Vê-se lá: Matilde. Tomar banho... Falando nisso. Maldita hora - agora, se eu não estivesse conversando comigo mesma, uma amiga falaria. Não, ela cantaria: “apressado come cru”. Bem feito, nascer de sete meses em pleno carnaval. Depois, na verdade. Logo depois, para ser mais sincera. Maldita hora mesmo, que tá chegando... tá. E será que nas cidades do interior carnavalescas que têm nomes compostos têm telefone? Assim, facinho. Pegou, ligou, dois minutos... eu vou falar calmamente: “ah... obrigada! Mais um, ê!” Ou vou ficar em silêncio engolindo que eu odeio carnaval, que odeio as magníficas possibilidades dos carnavais e arriscaria um “imagina! Eu, libertária, oras!”. Mentira... repete três vezes: libertária. Libertária. Libertária. Mais uma vez, minha amiga surgiria, verbalizando minha consciência: “Rá! Eu menti”. Mas, e daí? Eu odeio carnaval, seguro a garrafa de cerveja nas pontinhas (de todos) os dedos, odeio nomes compostos e cidades históricas momentaneamente carnavalescas. E eu estou bem... tô conversando comigo porque, sei lá, escutar crééeéu não dá, o vinho acabou e eu realmente odeio carnaval.

E... ah. Quem amanhã me desejar “muuuuuuuuuuitos amores”, vai se ver comigo...

- Aqui, queriiiiiiido. Brigadinha, mesmo. Esse eu pulo. Eles nunca vêm sozinhos. A propósito, assim que o mundo voltar ao normal e sairmos para beber, repare em como eu sirvo cerveja, ok?! Ah... mais um. Ê! Brigadinha. Hi-hi-hi.

Bom... Não quero, rá! Não. Não. Não. Três vezes que é para ter segurança na afirmação. Ok. Odeio carnaval. Grrrrrrrrr.

terça-feira, 29 de janeiro de 2008

Do nada faminto.

O nada quebra-me o silêncio.
























O vazio silenciado grita-me pelo estômago.

domingo, 27 de janeiro de 2008

O corpo faminto deseja pertencer, a existência sem nexo deseja ainda mais. Transforma-se em tinta, em seqüência numérica e em fotos por não pertencer ainda; como se não coubesse no que tem. Como o que há nesse pulsar de hora que não cabe no segundo que lhe é destinado. Teria dores e amores maiores que corpo? Não cabe em si e não se pertence e não se pertencendo transforma-se em contornos, deixando a visão, os talhes em branco no branco para os que, algum dia, conseguirem contornar-la em detalhes. Ela, há duas décadas, nasceu na quarta-feira de cinzas, talvez esteja, ai, a raiz da grande incoerência. Faminta, deseja pertencer... Pertencer-lhe.

sábado, 19 de janeiro de 2008

Ao lar.


O toque telefônico dela deveria exalar cheiro de café fresco e ser tão macio quanto o travesseiro quente por nós tantas vezes mentalizado. Aqui, meio a nada, meio a mim desconexa e meio a tudo, ele vem soar polifonicamente (e porcamente traduzido, desculpem-me...) “garota, coloque suas canções. Diga-me, qual seu som favorito?”, o que é sempre respondido com um sorriso que preenche o que há dentro e antecede o pensamento * daquilo sem cáspita * que deixa os dedos repousados, estáticos sobre o botão “ler” por dois segundos. Imaginado o que virá, a certeza de ter vindo aquilo que de forma diferente dos outros é correspondente somente a NOSSA gramática, se faz presente. E isso não muda, nem uma vez, sendo sempre tão seguro e completo de si (de nós!) que faz sentir que existe, e sempre existirá, um lar para me libertar. Amém!

sábado, 5 de janeiro de 2008

Considerou a cruel possibilidade de amar. Fechou os olhos. Quis sentir a malignidade do desejo e o tocou. Pegou-lhe com as mãos. Tocara o desejo um pouco mais do que duas ou três vezes e ele a tornara intensa, internamente intensa, em expansão. Tornara-se brasa e nisto habitara o perigo: poderia tornar-se chama alta, seguidamente, pó – o nada, sem foco. Considerou a ferocidade com que poderia doar-se, abdicar-se de muito e dela, trancafiar-se, comer-se e vomitar-se, vez e mais vezes. Sentia fome, doía-lhe a barriga porque tocara o desejo e precisava alimentar-se dele. Sentiu-se empacada, como animal estéreo que busca mais em vão. A dor que sentia não era desta busca, era do desejo de ter aquela fome perpetuamente. E, esta, sim, era vã. Sabia que o acaso não fala, sussurra, balbucia meias palavras e, gemendo, assombra-lhe na mocidade. O descuidado gemido do acaso, por sua vez, também, seria perpétuo. Já não havia mais tempo permissivo à frente ou possibilidade de alimentar-se dele, mas algo muito próximo à sua intensidade interna não lhe sossegava: era sabido; bastava-lhe coragem. Abriu os olhos. Considerou a cruel necessidade de amá-lo.

quinta-feira, 3 de janeiro de 2008

Sand Castle Dreams




Eu tive um sonho. Aqui, sentada olhando para a imensidão do nada, que mesmo que eu saiba que lhe pertenço, tenho-lhe certa repulsa. Mar. Fiz um montinho de areia. Busquei água tentando fazer torres. Enfiei os pés na areia. Sentei-me para vê-lo, em primeiro plano o montinho-castelinho de areia e todas as suas torres e em segundo plano o mar, calmo, de um azul esverdiado de perder-me por inteiro de vistas.






















De súbito, percebi o sonho que tive e enquanto pensava em levantar, com os pés, a torre secreta para ela se esvair em areinhas sendo levadas pelo vento, como no sonho, veio a maré alta e nos levou embora...


... ficando para mim, sem jeito, sem caber, o verde esperançoso, o vermelho da luta, as cores dos lustres e dos doces de festinhas infantis, o branquinho sincero das flores e pedidos à Iemanjá e quem sabe, um dia, noutra vida, ou somente em sonhos o cheirinho do vento que balança o ápice da vida, das minhas muitas vidas.