sábado, 9 de março de 2019

Eu choro.

Eu nunca pensei que sofreria preconceito. Sou uma parte ínfima da população: eu sou branca. Estudei em colégio particular católico. Nasci e cresci em uma família que nunca passou necessidade de nada. Ganhei um carro aos 18 anos. Comecei a trabalhar igualmente aos 18 anos e nunca mais parei. Moro sozinha. Pago minhas contas em dia. Tenho um excelente trabalho. Percebo de forma até constrangedora o quanto sou privilegiada, o quanto sempre pude ter e fazer tudo o que eu desejei. Eu nunca imaginei inocentemente que em algum momento eu pudesse passar por situações que pudessem me ofender sem que eu tivesse realizado algo fora do que é aceitável. Engano meu. Sempre pensei que se caso sofresse algo seria por ter tido todos esses privilégio. Engano! Privilegiada que sou, pude ter acesso a alguns coletivos que me fizeram aprender um pouco sobre humanidade, diversidade, caráter, vida comunitária e socialismo. Privilegiada que sou, conheci a umbanda, descobri que possuo um amor maior pelos meus orixás. Pouco depois descobri o Omoloko, raiz do candomblé, comecei a amar ainda mais essa energia incomum, trazida pelos negros africanos, vivida com muito sangue derramado pela doutrinação. Mas isso ainda não havia me machucado, privilegiada que sou.

Ingênua que sou e igualmente crédula no ser humano não imaginei que com uma transição de governo eu iria experimentar o que outras tantas pessoas vivenciam diariamente de forma sofrida! Com a posse do então presidente ficou escancarado todos os sentimentos aprisionados por pessoas que não conseguem entender e saber sobre sua responsabilidade de posicionamento no mundo. Criaram um mito. E esse mito trouxe a possibilidade de se questionar a liberdade das pessoas de pensar diferente! Pois bem, com meus 32 anos, pude vivenciar a ruptura do desejo básico do ser humano, no meu entendimento, ser amado e amar. Me pergunto aos litros de choro, o que é bem a minha cara: Como é possível que as pessoas se permitem a não tolerância?  Quanto custa na medida da vida a supressão do amor pelo desrespeito ao outro pelo simples fato de não se pensar igual? O quanto estamos desperdiçando de vida em nome de algo que é um retrocesso tamanho?! Como nos permitimos não ouvir o outro, não argumentar com educação e clareza? Onde isso se perdeu? Como eu me permiti falar aos berros algo que me dói e continuar a dizer que eu creio na tolerância e no amor? Não creio mais. Hoje não. Ainda que muito inferior a qualquer outro problema humanitário, sinto uma dor profunda por ser um pouquinho (bem pouco!) diferente. E com essa sensação que me coloco no lugar das mulheres, dos homens e mulheres negros, dos homossexuais, dos deficientes que não podem ter seu direito de existir respeitados e cada vez mais são colocados amordaçados por essa sociedade. 

Onde isso vai parar? Quando teremos paz de existir livremente e amar seja lá qual for sua decisão de amor? Até quando iremos nos comunicar aos berros? Algum dia alguém conseguirá ouvir os berros? 




Hoje eu me sinto imensamente triste. Hoje eu chorei copiosamente, não só por mim, mas pelo mundo. Hoje eu senti minha vida escoar, tive certeza que nosso destino será vermelho. 

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